Batemos persistentemente em diversas portas que se apresentam neste mundo, não
obstante, é frequente que as encontremos trancadas. O mundo gaba-se de seguir
certo tipo de seleção, e, nesta seleção, o que conta são o status social, a
fortuna e o sucesso. Sem tais símbolos, ficamos no escuro e na solidão exterior.
Porém, a entrada que conduz à essência mais íntima de Deus, esta se mantém
aberta a todos aqueles que a buscam com sinceridade.
Uns anos atrás, decidi visitar o mosteiro trapista que se estabeleceu no
interior do Paraná. Combinei a data da chegada, minha estada na hospedaria, e
comprei as passagens. Pretendia utilizar os dias do Carnaval para mergulhar em
uma experiência de silêncio e oração contemplativa. Chegando à rodoviária de
São Paulo, encontrei-a dominada por uma verdadeira balbúrdia de turistas
sufocados pela urgência de embarcar rumo às festas ou ao descanso em alguma das
praias do litoral brasileiro.
Demorei quase três horas para subir ao ônibus que me levava a Curitiba. Tão
logo conseguimos deixar a rodoviária, percebi que o trânsito na estrada também
não facilitaria em nada o objetivo. Havia previsto chegar a Curitiba
aproximadamente às seis da manhã, e embarcar noutro ônibus em direção a Campo
do Tenente, onde foi construído o mosteiro. Contudo, devido a tantos
contratempos, acabei desembarcando ao meio-dia.
O resultado foi o seguinte: tinha perdido o ônibus matutino que me conduziria
a Campo do Tenente. A condução seguinte partiria somente ao final da tarde.
O outro ônibus acabou me deixando na estrada, perto de um posto de
gasolina, e ali eu peguei carona com um caminhoneiro. Só consegui chegar ao
mosteiro trapista às dez horas da noite. Como o ambiente caracteriza-se por ser
campestre, não encontrei ali no local senão a claridade da lua e das estrelas. Observando
o céu, admirei-o detidamente. Há tempos não testemunhava o firmamento com tanta
beleza.
Só preciso agora encontrar a
entrada do mosteiro, pensei. Sem isto,
dormiria ali mesmo, ao relento.
Sentia-me exausto. De fato, estava em viagem há quase vinte e quatro horas,
e naquele momento desejava apenas tomar banho e dormir bastante. No entanto,
aquilo que parecia simples, rápido se tornou problemático. Recordei-me que,
devido às vigílias que ocorrem na madrugada, os monges trapistas costumam
adormecer cedo. Como entraria?
Bati em várias portas. Tentei abri-las girando a maçaneta, porém, nenhuma
delas cedeu. Fiquei desconsolado. O céu noturno era absolutamente lindo, mas eu
não estava disposto a dormir sobre a relva. Suspirei. Por fim, passados alguns
minutos de hesitação, descobri uma pequena porta meio escondida junto ao jardim.
Sem outra possibilidade, tentei aquela última esperança. Quase não consegui
acreditar quando percebi que ela se encontrava aberta.
Foi a salvação!
Caminhei pelo interior do mosteiro e, em determinado instante, deparei-me
com um monge. Fiquei satisfeito, conquanto ele se demonstrasse visivelmente perturbado.
Só depois de uma conversa brevíssima, fui entender o motivo de sua perturbação:
eu havia invadido a clausura dos monges trapistas. Naquele local, apenas os
consagrados têm o direito de entrar. Mas como eu não atinara com o equívoco,
irmão Rafael (chamava-se assim) gentilmente me acomodou na hospedaria.
Pensei bastante nesse episódio desde então. Muitos católicos afirmam que a
vida monástica representa o coração espiritual da Igreja. Se isto condiz com a
verdade, a clausura dos monges é o mais próximo daquilo que nós consideramos ser
o coração amoroso de Deus. Pois naquele espaço, envoltos pelo silêncio de uma existência
dedicada exclusivamente a Jesus Cristo, os religiosos devem experimentar esse
amor de maneira privilegiada.
Havia diversas portas na ocasião, porém, somente aquela que conduzia à
intimidade de Deus conservava-se aberta.