Passados mais de quatro anos desde a eleição de Francisco como Sumo Pontífice católico, torna-se possível concluir certas coisas a respeito de seu pontificado. Oriundo de um país não europeu, Jorge Mario Bergoglio tem procurado dar enfoque a questões que estiveram mais ligadas à vertente sulamericana da teologia. Os adeptos da Teologia da Libertação defenderam, desde sempre, a justiça social e as políticas ecológicas, por exemplo, e uma maior inserção de homossexuais no seio da sociedade. Muitas vezes, Papa Francisco colocou-se ao lado dessas questões, afinando-se, por exemplo, com o discurso dos movimentos de sem terras. Em seu pontificado, temas mais tradicionais como o aborto e o divórcio ficaram um tanto quanto relativizados, embora não se possa afirmar que ele tenha modificado substancialmente a doutrina católica em tais quesitos.
Por outro lado, foram benfazejas, sem dúvida, suas decisões de conclamar o Ano da Misericórdia em 2016, de consagrar o Vaticano a São Miguel Arcanjo e de aproximar mais a figura papal das pessoas por onde passou nesses anos recentes.
Quando eleito, houve naturalmente a evocação da famosa profecia de São Malaquias. O santo irlandês do século onze listou 111 papas que se sucederiam até o fim do mundo. Cada um deles recebe do profeta uma denominação simbólica, sendo que o último é chamado de Pedro Romano. O conclave que elegeu Francisco, teoricamente, nos ofereceu a derradeira figura dessa lista ancestral, e antes que se soubesse o nome do escolhido, muito se conjecturou acerca do nome desse cardeal eleito ou do país de origem. Naturalmente, os purpurados que tivessem Pedro em seu nome de batismo ou fossem romanos de nascimento pareciam ser os mais cotados. No entanto, Bergoglio não se enquadraria nessa descrição, dessa forma, nos anos que se seguiram, a profecia pareceu ter-se mostrado equivocada.
Mas analisando objetivamente, não acredito que se deva desprezar a profecia tão rapidamente. Isso afirmo porque as descrições simbólicas dos papas anteriores nem sempre fazem referência ao nome de batismo ou à cidade de origem. Por exemplo, João Paulo II é chamado de Trabalhador do Sol, cuja interpretação parece estar vinculada à dinâmica de trabalho incansável de seu pontificado, com viagens constantes a diversos países.
O que concluir, então, do nome Pedro Romano? Uma das possibilidades consiste em tentar compreender a figura do primeiro Papa da Igreja Católica: o pescador Pedro, escolhido diretamente por Jesus Cristo. O apóstolo que foi incumbido de conservar as chaves do Céu, rocha sobre a qual Cristo edificaria sua igreja, frequentemente se revela um indivíduo de posturas dúbias. Tem fé suficiente para ir ao encontro de Jesus ao vê-lo caminhando sobre as águas, embora vacile e afunde. Faz um verdadeiro testemunho da divindade de Cristo e por esse motivo é louvado, embora em outro momento tente afastar o Mestre de sua missão, sendo chamado de Satanás. Nega Cristo três vezes antes do galo cantar, e três vezes reafirma seu amor ao Filho de Deus depois de sua ressurreição.
Papa Francisco causa, às vezes, a impressão de ter posturas demasiado dúbias. Houve momentos, por exemplo, em que o Vaticano necessitou corrigir, às pressas, declarações de Bergoglio, com a justificativa de que não fora exatamente isso o que o Papa dissera. O bispo de Roma já suscitou, ao mesmo tempo, críticas e elogios, e não somente de segmentos diversos da cristandade, mas inclusive de indivíduos específicos. Ou seja, nem sempre é fácil compreender de que lado o homem se encontra.
Se ele é, de fato, o último Papa ou o Papa dos últimos tempos, isso só o tempo poderá afirmar. Antes disso, resta-nos testemunhar a história, e tentar entendê-la.
Gabriel Santamaria é autor de O Evangelho dos Loucos (romance), No Tempo dos Segredos (romance), Assim Morre a Inocência (contos), Destino Navegante (Poemas), Para Ler no Caminho (Mensagens e Crônicas).
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